quarta-feira, 13 de março de 2013

DISCUSSÃO JURÍDICA


Vejam o que acontece quando um casal discute e ambos têm formação jurídica:


Desajeitado,  o magistrado Dr. Juílson tentava equilibrar em suas mãos, a cuia, a térmica,  um pacotinho de biscoitos, e uma pasta de  documentos.
Com toda esta  tralha, dirigir-se-ia para seu gabinete, mas ao dar meia  volta deparou-se com  sua esposa, a advogada Dra. Themis, que já o  observava há sabe-se lá quantos  minutos.
 O susto foi tal que cuia, erva e documentos foram ao chão.  O juiz  franziu o cenho e estava pronto para praguejar, quando observou  que a testa  da mulher era ainda mais franzida que a sua.
Por se tratarem de dois juristas  experientes, não é estranho que o  diálogo litigioso que se instaurava  obedecesse aos mais altos padrões  de erudição processual.
– Juílson! Eu  não agüento mais essa sua inércia. Eu estou carente,  carente de ação, entende?
– Carente de ação? Ora, você sabe muito bem que, para sair da  inércia,  o Juízo precisa ser provocado e você não me provoca, há anos. Já eu  dificilmente inicio um processo sem que haja contestação.
– Claro, você preferia que o processo corresse à revelia. Mas não  adianta, tem que haver o exame das preliminares, antes de entrar no mérito. E mais, com você o rito é  sempre sumaríssimo, isso quando a  lide não fica pendente... Daí é que a execução fica frustrada.
– Calma aí, agora você está apelando. Eu já disse  que não quero  acordar o apenso, no quarto ao lado. Já é muito difícil colocá-lo para  dormir.
Quanto ao rito sumaríssimo, é que eu prezo a economia processual e  detesto a morosidade. Além disso, às vezes até uma cautelar pode ser satisfativa.
– Sim, mas pra isso é preciso que se usem alguns recursos especiais.
Teus recursos são sempre desertos, por absoluta ausência de preparo.
– Ah, mas quando eu tento manejar o recurso extraordinário você sempre  nega seguimento. Fala dos meus recursos, mas impugna todas as minhas  tentativas de inovação processual. Isso quando não  embarga a execução.
Mas existia um fundo de verdade nos argumentos da Dra. Themis. E o Dr. Juílson só se recusava a aceitar a culpa exclusiva pela crise do relacionamento.
Por isso, complementou:
– Acho que o pedido procede,  em parte, pois pelo que vejo existem  culpas concorrentes. Já que ambos  somos sucumbentes vamos nos dar por  reciprocamente quitados e compor amigavelmente o litígio.
– Não posso. Agora existem terceiros interessados. E  já houve a  preclusão consumativa.
– Meu Deus! Mas de minha parte não havia sequer suspeição!
– Sim. Há muito que sua cognição não é exauriente. Aliás, nossa relação está extinta. Só vim pegar o apenso em carga e fazer remessa  para a casa da minha mãe.
E ao ver a mulher bater a porta atrás de si, Dr. Juílson fica tentando compreender tudo o que havia acontecido. Após deliberar por alguns minutos, chegou a uma triste conclusão:
– E eu é que vou ter que pagar as custas...




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